curiosidades
da história

alguns factos e pormenores
que dão vida à narrativa

as cartas

vozes distantes que alteram o destino

«Foi no dia 18 de Fevereiro de 1944, numa sexta‑feira fria e chuvosa, que a carta do além‑mar finalmente chegou às mãos do regedor de Cabreiros. Nos selos, havia um desenho de todo o continente sul‑americano, com o Brasil pintado a verde.»

Sem telefones nas aldeias, as cartas eram mais do que simples palavras escritas — eram pontes entre mundos separados pela distância e pelo isolamento. Esperava-se por elas ansiosamente; cada envelope podia trazer uma alegria inesperada ou uma má notícia capaz de mudar tudo.

No livro, as cartas assumem um papel central. Quatro delas destacam-se, marcando momentos de viragem na vida das personagens — tempos de revelação, de esperança ou de desespero. Mais do que mensagens, estas cartas são agentes do destino, desvendando segredos e desencadeando mudanças que redefinem o rumo da narrativa.

pervitin

a droga da guerra

Durante a Segunda Guerra Mundial, esta "pílula milagrosa" foi amplamente usada pelo exército alemão, mantendo os soldados acordados e alerta durante dias. Consumida também por oficiais e pelo próprio Hitler, esta metanfetamina alimentava uma confiança desmedida, mas frequentemente resultava em estados delirantes. 

«O resto da motivação chegou a Kurt Dithmer na forma de duas pastilhas de Pervitin, devidamente aviadas pela goela abaixo com um generoso trago de conhaque vindo da França ocupada.»

O Pervitin tem uma presença mais ou menos constante ao longo da narrativa do livro, já que algumas das personagens dependem dele para manter o seu incansável esforço a favor do Terceiro Reich.

aguardente com mel

goles de consolo e de coragem

Se o Pervitin ajudava os alemães a superar as agruras da guerra, nas serras portuguesas a aguardente com mel tinha efeito semelhante. Por isso, havia sempre um motivo para beber…

«Era na aguardente com mel que Domingos do Aido encontrava alívio para a mágoa que o consumia. E por uma boa razão: o álcool aligeirava‑lhe o sofrimento, enquanto a doçura do mel o distraía do azedume da morte que lhe manchara o passado.»

Ao longo do livro, a aguardente com mel está sempre presente, trazendo conforto nas horas sombrias, aquecendo os corpos nos longos invernos, transformando covardia em coragem, e adicionando euforia aos tempos de festa. Mais do que isso, é um elixir com poderes especiais…

kurt dithmer

o nazi que tinha pena dos pobres

Entre as inúmeras personagens do livro, várias são figuras reais. Destas, Kurt Dithmer destaca-se como a mais paradoxal. Era o testa-de-ferro de uma rede de influentes envolvidos nas minas do norte do país. Chegou a Portugal envolto em mistério, e assim desapareceu.

Como ele, muitos oficiais nazis estiveram em Portugal durante a guerra, coordenando operações comerciais e influenciando decisões estratégicas do regime ditatorial de Salazar. 

«Nessa noite, e como era habitual, nele convergiam os membros de uma liga especial de gente presunçosa e perigosa, rotulada de Grupo Alemão do Porto pelos serviços secretos americanos. Vestidos pelos melhores alfaiates da cidade, os afiliados de tão exclusivo círculo tinham o poder e a influência que só o dinheiro trazia em terra de gente pobre.»

borda d'água

a sabedoria em papel

Publicado desde 1929, o Borda d'Água era mais do que um simples calendário. Oferecia previsões meteorológicas, conselhos agrícolas e informações sobre tradições e crenças populares, combinando conhecimento empírico com sabedoria ancestral.

Este almanaque faz apenas uma breve aparição no livro, mas revela-se crucial. É nas suas páginas que se consultam as fases da lua — um detalhe aparentemente banal, mas essencial para enfrentar um mistério inquietante que perturba as noites serranas.

«— Não estava lua cheia.
— E quando é que vai estar? — quis saber David.
— Já digo. — Custódio foi atrás do balcão e de lá tirou um livreto de capa ornamentada com desenhos toscos, onde se lia Borda d'Água.»